sábado, 8 de setembro de 2007

A torneira quente ele abria primeiro. Ali regulava a temperatura do banho, já que da azul vinha praticamente sempre o mesmo volume de água.

Fora mandado embora pela mulher, vivera na rua por uns tempos. Cada dia dormindo num lugar. O antigo projeto do harém lhe ajudou, isso não podia negar. Algumas torciam o nariz, outras não gostavam mesmo, mas o recebiam. Eventualmente, apelava para os amigos – esses, sim, se surpreenderam. O cara não era disso.

No trem foram poucas noites, menos do que nas estações. Das que passou fora de fato, o mais que fez foi cruzá-las desperto. Em muitas, um tanto bêbado – de não ter nem memória de uma meia dúzia delas.

Apesar do pouco estudo, se expressava bem. Tanto para complicar quanto para esclarecer. Quando bebia, misturava raciocínios complexos com outros mais simples. Num dos porres, conversou longamente com um outro ébrio que se escorava por ali. Havia até uma brisa, mas nada muito frio.

Esperto e bondoso, percebeu que o companheiro era pouco ilustrado. O que não impediu que fizesse a pergunta:

- Que passa?

- Pé na bunda.

- ...

- Contigo?

- ... o quê?

- Que que deu?

- Nem sei mais.

Influenciado por um livro qualquer e com uma palavra nova na boca, entra no banho. Lembra da mulher, mas não sente falta.