domingo, 2 de setembro de 2007

O azul do céu - se alguém estivesse entre o firmamento e a protagonista poderia ver - é o mesmo das vistas que agora olham esta praticamente primeira estrela. Seria difícil para um suposto observador dizer qual dos contrastes é maior. Se uma estrangeira tão estrangeira pisar estas pedras, se ter um antagonista tão antagonista como companhia, ou se a simples diferença entre a cor dos olhos e do céu diante do Kremlin que ambos admiram e o anil cobre.

Os paralelepípedos russos estão úmidos - não é da chuva dos dias anteriores, é apenas o anoitecer. São onze e meia, falta pouco para as doze. O antagonista anota qualquer coisa na espécie de diário que carrega. Será que não confia na própria memória? Descobrirá, como a nossa personagem principal, que certos ambientes e sentidos são mais fortes que nós mesmos.

Ela já havia chegado a essa conclusão, mas não será desonesto o pensar do aéreo voyer quando a vir trazendo a cabeça do queixo para o alto, respirando fundo e fechando os olhos, depois de mirar aquela lua mais uma vez. É quase medo o que brota do corpo, das vistas azuis da protagonista - será que terei em mim um pouco que seja do que sinto aqui?

Não, este que (sabe-se lá como) está entre o céu e o antagonista e a protagonista não erra ao supor ser esta a preocupação que acaba de se esvair da mente da jovem adulta; mas já bastante adulta.

A surpreende, agora, longos meses depois de ter estado lá, experimentar na plenitude do que é a intensidade do que viveu no eterno instante em que a Praça Vermelha era ela também. O antagonista, refém da nacionalidade, abandona o tio como quem nada contra uma corrente de sangue mesopotâmico, na tentativa brava e inútil de manter pelo menos a própria dignidade.

A improvável dupla vai embora, os toques das cochas e uma mão deixada cair pelo antagonista tenham talvez sido barrados também pela imponência unificada que está até - e principalmente - nas cortinas do Bolshoi.

- Niet!

É só o que entendem, mas compreendem muito mais do que isso.

No bloquinho, o nome de Lênin como no mausoléu, uma breve descrição da cena - em duas, três linhas. A sequência da ópera não poderia ter melhor final que um antagonista e uma protagonista neste cenário em que vistas femininas e um firmamento se admiram.

O chão está úmido, assim como dela os olhos. Não pelo frio - estamos no meio do ano.